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sábado, 17 de julho de 2010

Espaço de discussão, novidades no cenário violonístico, instrumentos...

Saudações musicais!

Há muito tempo venho com a ideia de criar um blog que fosse uma extensão do trabalho que desempenhava na Violão PRO. Devido a limitação do espaço físico do papel, muitas coisas legais ficavam de fora das edições. Espero, de alguma forma, ajudar a difundir através do blog "PAPO DE VIOLONISTA" dicas legais para quem toca (ou quer aprender a tocar) violão, trabalhos bacanas desenvolvidos por músicos criativos e talentosos e, é claro, novidades no universo violonístico no que se refere a instrumentos e acessórios.
Fique à vontade e, qualquer dúvida, só mandar sinal de fumaça! ;)

A Encruzilhada Musical: Vivendo entre o Sagrado e o Profano (por Miguel De Laet)

Enquanto no terreiro se ouve os três atabaques - rum rumpi e lê - chamando os Orixás, um violeiro faz soar um inebriante acorde de sua viola após ter encontrado numa estrada escura a cobra coral - que, dizem os antigos, se tratar do próprio "tinhoso" vindo do mundo sobrenatural - para pactuar-se com o Senhor das Trevas com o intuito de dominar o instrumento musical místico e tocar na Festa do Divino. Da mesma forma, o bluesman segue seu caminho até a encruzilhada para encontrar o próprio Diabo para afinar o seu instrumento e conseguir, através dele, fama e sucesso.

De fato, o ponto em comum que encontramos nos vários personagens que fazem parte do mundo da música, e que parece mover o ser humano em direção do desconhecido, é o desejo de sentir, ao menos um instante, o gosto da "Liberdade". O sonho – para muitos, utópico - de tornar-se um ser capaz de manter-se suspenso, acima da terra, livre como Fernão Capelo Gaivota, alimenta o nosso espírito inquieto que tenta, de diversas maneiras, libertar-se da prisão do corpo para voar alto, para além das estrelas. Acontece que, para tornar-se independente, é necessário renunciar as amarras, cortar o nosso cordão umbilical e sacrificar o corpo; se faz necessário sentir as dores e a agonia da descompassada arritmia cardíaca, taquicardia supraventricular, aparentemente antimusical e mortal, para viver num universo atemporal e imparcial.

O próprio som nasceu do sacrifício. As cordas de tripa de carneiro que soavam no antigo alaúde; o couro de peixe que vestia o oriental Derbak; os instrumentos alegres do nosso carnaval revestidos com pele animal – couro de gato, couro de cobra, couro de bode -; todos eles são prova evidente do sacramento do som. O sacrifício do corpo que se torna sinal visível do som invisível e imaterial capaz de atravessar muitas barreiras. O Som que vence o silêncio da Morte e que só se faz ouvir através dela, trazendo aos homens a Esperança de uma Vida Imortal, consolo dos fracos segundo alguns "existencialistas". "Acontece que as orelhas não têm pálpebras", disse Pascal Quignard. Destarte, o que os olhos vêem é limitado e o que os nossos ouvidos captam, muitas vezes, vai mais além. "O som penetra. Ele é o estuprador". O som é o Todo-Poderoso, criador do Universo, princípio e fim de todas as coisas. O som é Livre e aquele que ouve, escravo ou liberto!

O período clássico eleva a figura do ouvinte pagante em detrimento da Liberdade do som, sem nenhum sinal de arrependimento. A própria ordenação e organização sistemática musical podem ser, então, interpretadas como um sacrifício, pois o jardim musical dos clássicos foi concebido através do cultivo artificial e formal de espécies ornamentais escolhidas a dedo – em sua maioria, bastante simples. Caso houvesse um crescimento de uma herbácea capaz de modificar a disposição do jardim, a mesma era removida, ou melhor, sacrificada pelo "bem do conjunto" e da satisfação do cliente que está pagando pelo serviço. Mesmo assim, a música não deixa de ser "Arte". Quando o artista ouve o som que toca no lugar mais profundo do seu ser e o transcreve fielmente sem deixar que a racionalidade material o perturbe, suas obras são colocadas num "Hall" especial e seu nome imortalizado. Foi assim que Mozart escreveu o protótipo da "Ópera Alemã", Die Zauberflöte (A Flauta Mágica), por exemplo, e conquistou a sua Liberdade vencendo sua partida de Xadrez contra o Anjo da Morte e do Esquecimento.